Histórias da Cardiologia por Reinaldo Hadlich


A hipertensão arterial no Brasil, em seu início

Recentemente, contatei o professor Rafael Leite Luna para que fizesse uma abordagem histórica do tema mencionado. Conta-nos ele que nos anos 1950, os diuréticos tiazídicos formavam o principal grupo farmacológico para o tratamento da hipertensão sistólica, com decréscimo médio de 4 a 6 mmHg.

Com o passar dos anos, melhores fármacos foram surgindo, principalmente contra a hipertensão diastólica. Novos diuréticos, os betabloqueadores, os inibidores da enzima de conversão da angiotensina e os bloqueadores de cálcio.

Ele refere que em 1955, ano de sua formatura, já havia resultados alentadores em relação ao controle da hipertensão arterial. Já se conhecia o fator racial relacionado à medicação. O negro responde melhor ao diurético e o branco, ao betabloqueador. Outros dados conhecidos na época: a medicação diminui a morbidade e a mortalidade tanto por AVC quanto por insuficiência cardíaca. A pressão arterial cai para níveis satisfatórios, após algum tempo de medicação. Duas substâncias em um único comprimido facilita o uso da medicação.

Nas primeiras década do século XX, os esfigmomanômetros de coluna de mercúrio vinham da França. A medida rotineira da PA passou a ser popular. No começo, a hipertensão arterial era ligada à chamada doença de Bright, caracterizada por uma nefrite. Posteriormente, notou-se que aparecia independente da nefrite, o que modificou totalmente a história da doença.

Na década de 1950, havia dois grandes estudiosos do tema: no Rio de Janeiro, o Prof. Genival Londres, e em São Paulo, o Prof. Dante Pazzanese. O Prof. Luna, juntamente com o Prof. Magalhães Gomes em 1956, no Recife, apresentou o seu primeiro trabalho sobre 50 casos de hipertensão maligna que ceifava a vida dos doentes em dois anos como se fosse um câncer hoje em dia.

Em 1958, o Prof. Reinaldo Chiaverini de São Paulo realçava que não havia medicamento eficiente para essa doença que grassava desprotegida, obrigando a se recorrer a uma cirurgia ampla, a simpatectomia bilateral (operação de Smithweek) para proteger o paciente por três a quatro anos, quando a inervação voltava novamente a funcionar normalmente.

Ainda na década de 1950, começaram a aparecer medicamentos efetivos: o pentametônio e o hexametônio, ambos com importantes reações colaterais. Logo depois a tiazida, a guanetidina, a hidralazina e a alfametildopa.

Na década de 1960, surge o propranolol, e o Prof. Luna foi o primeiro a usá-lo com um pequeno grupo de médicos. Na década de 1970, Rocha e Silva, um cientista brasileiro, descobriu a bradicinina e teve o seu nome citado para o Prêmio Nobel. Na mesma época, Sérgio Ferreira, em Ribeirão Preto, fez os estudos iniciais que levaram aos inibidores da enzima de conversão da angiotensina.

As formas secundárias da hipertensão, raras, em geral se fosse num jovem, eram enviadas a um pediatra ou a um nefrologista. Os quadros emergenciais eram em geral tratados por um intensivista. A hipertensão infantojuvenil, pela possibilidade da coartação da aorta, era encaminhada ao cirurgião vascular.

Tudo isso resultava num grande benefício para o paciente, acrescentando anos à sua vida e grande prazer e satisfação na velhice. O Prof. Luna refere ser hipertenso há 40 anos, e durante todo esse tempo o uso de 50 mg de atenolol diários mantém a sua PA 120/70. Todas as vezes que a verifica. A cada seis meses faz um exame simples de urina, dosa a glicose e ureia e um ECG. Todos os pacientes hipertensos deveriam também fazê-lo pelo menos anualmente.

O Prof. Luna também aconselha que homens aos 40 anos e as mulheres aos 50 anos realizem tais exames, já que a esclerose da arteriola, com hialinização e proliferação da íntima, propicia a elevação da pressão arterial. Reinaldo Hadlich é professor do Instituto de Pós-Graduação Médica do Rio de Janeiro, presidente do Centro de Estudos do Instituto Estadual de Cardiologia Aloysio de Castro e vice-presidente do Departamento de Clínica Cardiológica da Socerj.