Jornal SBC 193 | agosto 2018

Relação Médico Paciente por Protásio Lemos da Luz Protásio Lemos da Luz é Professor Sênior de Cardiologia do InCor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) Medicina e sensibilidade “A senhora tem uma doença grave. Eu tive três casos assim, e todos mor- reram”. Este é o relato de uma pacien- te sobre a conversa que teve com um médico enquanto estava hospitalizada com insuficiência cardíaca por miocar- diopatia periparto. Outros dois casos recentes, que não vou discutir, também protagonizaram atitudes semelhantes, nos quais claramente as palavras do médico causaram mais apreensão e sofrimento do que apoio aos pacientes. Estas situações são sintomas de uma grave lacuna na assistência médica: falta de sensibilidade e de compreen- são da natureza humana. Esta maneira desajeitada de se co- municar com pacientes desconside- ra três elementos: (1) o diagnósti- co pode estar errado ou o paciente pode representar uma exceção no espectro da doença; variações gê- nicas, hoje bem documentadas, po- dem condicionar evoluções diver- sas em uma mesma doença; (2) as pesquisas estão ocorrendo em alta velocidade, e aquilo que não é tra- tável hoje poderá sê-lo em curtíssi- mo prazo; (3) o modo rude de falar sobre uma doença grave em nada ajuda o paciente. A pessoa doente precisa de amparo emocional, espe- rança e conforto − não de estatísti- cas frias. Alguns são mais sensíveis e se abalam com notícias ruins; ou- tros são mais fortes emocionalmente e enfrentam o infortúnio com força e determinação. E está cristalino que aspectos emocionais, como de- pressão e ansiedade, pioram a evo- lução de doenças como cânceres e cardiovasculares. Por isso, hoje existem os cuidados paliativos, que foram sistematiza- dos precisamente para consolar as pessoas em situações terminais. As atitudes impróprias relatadas são, em parte, por conta da inadequada formação médica baseada, sobretu- do, em tecnologia e com descuido do lado humano. No entanto, sempre compete ao médico tratar o doente com respeito e dignidade, e nun- ca privá-lo deste bem inalienável: a esperança. 29

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