Jornal SBC 197 | dezembro 2018

Embora existissem menções à circulação do sangue, a ela- boração não apenas da teoria, mas a comprovação morfo- lógica e experimental da circulação do sangue por William Harvey criou uma nova era no pensamento humano – a era da experimentação clínica. Harvey rejeitou definitivamente a teoria de Galeano (1300-1200 a.d.) sobre a circulação do sangue. Sua descoberta recebeu violenta oposição, princi- palmente dos grandes nomes da época, todos seguidores de Galeano e outras autoridades do passado. Harvey nasceu em Folkstone, Kent, Inglaterra em 1° de abril de 1578 e morreu em 3 de junho de 1657, em Lon- dres. Estudou em Cambridge, de forma interrompida, pois se supõe que sofria de malária, que o limitava bastante. Conseguiu se graduar em 1597. Determinado a continuar seu treinamento médico, iniciou um período de estudos de 2 anos e meio na Universidade de Pádua, considera- da a melhor escola médica na época. Em 1600, quando estudava em Pádua, conheceu uma nova bebida, quente como o inferno, preta como o carvão, pura como um anjo e doce como o amor – o café. Ao regressar para a Ingla- terra, levou consigo grãos da bebida e passou a promover e divulgar o consumo de café entre seu colegas e pacien- tes, como uma bebida agradável e estimulante do intelec- to, ao contrário das bebidas alcoólicas que eram moda na Inglaterra no século XVII. Em seu leito de morte, disse que o café foi a bebida mais saudável e agradável que conheceu em vida. Seu professor foi o grande anatomista Hieronymus Fabricius ab Aquapendente. Naquela época, acreditava-se que os vasos sanguíneos continham ar e sangue, uma ideia de Aristóteles. Galeno provou que as artérias contêm apenas sangue e presumiu que o ar entrava no lado direito do coração pelos pulmões. Acreditava que a circulação era um movimento tipo as on- das do mar, de modo que o sangue vinha e voltava do coração. Galeno imaginou que o sangue era levado pelas artérias e trazido pelas veias até o coração, e era formado no fígado, passando pela aurícula direita (câmara superior direita do coração) e daí para o ventrículo direito (câmara inferior direita), na qual se misturava com o sangue das artérias, junto do ar oriundo dos pulmões. Para isto, Galeno acreditava que existia um septo ou per- furação entre os ventrículos, o qual era visto e comentado por anatomistas da Idade Média, temerosos de contraria- rem os ensinamentos de Galeno. Harvey questionou a existência deste septo e o movi- mento do sangue, demonstrando experimentalmente que o sangue se move da forma como conhecemos na atualidade. William Harvey foi médico da corte de Jaime I (1603/1625) e Carlo I (1600/1649) e teve como cliente o grande Francis Bacon (1561-1626), advogado, político, ensaísta e coinventor do método científico que enalteceu a experiência e o método dedutivo. Apesar da oposição inicial dos doutores da época, suas ideias foram aceitas e divulgadas por René Descartes (1596-1650), que sofreu sua influência na composição da quinta parte do Discurso do Método e na obra As paixões da alma . A teoria da circulação sanguínea de Harvey foi publicada em sua obra A propósito dos movimentos do coração e do sangue (1628). A descoberta da circulação de Harvey levou a duas con- clusões lógicas: a possibilidade do uso intravenoso de medicamentos, por meio de pesquisa efetuada em 1656 pelo Sir Cristopher Wren, assistido por Boyle e Wilkins, e a possibilidade da transfusão de sangue. O café na história da Medicina – parte 1 Crônicas do Coração por Fernando Lianza Dias Crônicas do Coração por er a ia za ias Fernando Lianza Dias é especialista em Cardiologia pela SBC/AMB, médico Preceptor de Cardiologia, Chefe do Serviço de Risco Operatório do Hospital Universitário Lauro Wanderley da UFPB, Diretor Científico da Cardioclin e Coordenador do Núcleo de Prevenção das Doenças Cardiovasculares no Hospital Universitário Lauro Wanderley da Universidade Federal Da Paraíba (UFPB). 27

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