Jornal SBC 192 | Julho 2018

Histórias da Cardiologia por Reinaldo Hadlich Reinaldo Hadlich é Professor do Instituto de Pós Graduação Médica do Rio de Janeiro, Presidente do Centro de Estudos do Instituto Estadual de Cardiologia Aloysio de Castro e Vice Presidente do Departamento de Clínica Cardiológica da Socerj. Adrenalina pura Manassés C. Fonteles* Cinco prêmios Nobel em 40 anos! Não é sempre que se pode ver uma linha científica tão bem demarcada quanto a que surgiu há 70 anos, nas mãos do farmacologista Raymond Perry Ahlquist e veio culminar no Nobel de quí- mica de 2012, concedido à Lefkowitz e Kobilka. Em 1948, Raymond Ahlquist introduziu o conceito de re- ceptores adrenérgicos, sendo divididos em alfa e beta. Esta descoberta levou-o a receber o prêmio Lasker de 1976, embora Raymond Ahlquist não tenha vivido o sufi- ciente para ver o reconhecimento de sua descoberta pela academia sueca. Verificou-se que os receptores beta es- timulam a atividade cardíaca, fazendo o coração bater com mais força e mais rápido, e são importantes para função pulmonar (asma). Dez anos depois, Powell e Sla- ter, consolidaram a descoberta, com a criação do diclo- roisoproterenol, depois substituído por uma substância presente nos receituários da cardiologia até os dias de hoje, o propranolol, descoberto por James Black e seu grupo do Imperial College . Hoje temos betabloqueadores mais sofisticados direcionados a subreceptores β 1 , β 2 e β 3 , que atuam diretamente no coração, nos brônquios e nas células gordurosas. Robert J. Lefkowitz e Brian Kobilka ampliaram o estu- do dos receptores adrenérgicos e verificaram o acopla- mento entre o receptor beta e a proteína G. O trabalho, iniciado em 1968, buscava descobrir a localização de moléculas nas células em que os hormônios se fixavam. Observou-se que o receptor adrenérgico é semelhan- te àquele encontrado nos olhos, abrindo amplo cam- po para desenvolvimento de drogas para o glaucoma. Essa descoberta ainda criou perspectivas para a com- preensão dos mecanismos de recepção dos sabores e dos odores, e o funcionamento da histamina, dopamina e serotonina. Essa linha de pensamento que claramente remonta a Ahl- quist levou a cinco prêmios Nobel, pela ordem: em 1971 Earl Sutherland Jr. descobre o AMP cíclico, o segundo mensa- geiro, pós-receptor celular; em 1988, James Black (grande amigo de Ahlquist), descobridor do propranolol, recebeu seu Nobel; em 1994, Alfred Gilman e Martin Rodbell descobrem a proteína G e dão um passo para explicar os mecanismos intracelulares de regulação; em 1997, Jens Skow caracteriza o receptor Na + K + ATPase, importante para o conhecimento dos sinais elétricos das membranas celulares e, finalmente, em 2012, Lefkowitz e Kobilka. Setenta anos de trabalho das melhores cabeças da farmacoquímica mundial chegam a uma série de novas drogas para o tratamento de males car- diovasculares, como a prevenção da morte súbita pós-infarto, e no tratamento da asma com remédios mais modernos e eficazes, com menos efeitos colaterais. *Manassés C. Fonteles é membro da Academia Brasileira de Ciências e da Academia Nacional de Medicina. O professor Ahlquist foi seu orientador de Ph.D em Farmacologia Médica. Manassés Fonteles Foto: Divulgação 22

RkJQdWJsaXNoZXIy MjM4Mjg=