Jornal SBC 209 | dezembro 2019

Crônicas do Coração por Fernando Lianza Dias Crônicas do Coração or Fernando ia za ias Fernando Lianza Dias é especialista em Cardiologia pela SBC/AMB, médico Preceptor de Cardiologia, Chefe do Serviço de Risco Operatório do Hospital Universitário Lauro Wanderley da UFPB, Diretor Científico da Cardioclin e Coordenador do Núcleo de Prevenção das Doenças Cardiovasculares no Hospital Universitário Lauro Wanderley da Universidade Federal Da Paraíba (UFPB). Música para nós, Médicos Música é fator de encantamento para todos, na diversidade de idades, épocas e acontecimentos. Para nós, médicos, que vivemos o sofrimento alheio, representa não apenas a busca da beleza, mas também a conquista de fases de tranquilidade, relaxamento e conforto. Não me refiro aos mais dotados compositores ou instru- mentalistas, mas aos que, como eu, são apenas capazes de sentir e de amar as peças musicais. Por isso, nessas palavras sintéticas, serei mais “pessoal”, trazendo aos co- legas e ao público algo do que vive em meu espírito e en- volve minhas atividades. Sabemos que não são raros os exemplos de médicos ap- tos à análise profunda de obras célebres. Um deles perma- nece ainda muito vivo na minha memória: é o sempre sau- doso e emblemático Mestre Luiz V Décourt, catedrático e emérito da faculdade de medicina da Universidade de São Paulo (USP), de quem tive a honra e o privilégio de ter sido discípulo. Sua erudição e genialidade está expressa no ad- mirável estudo que fez do Quarteto XIV (Op.131) de Bee- thoven, o mais importante de um conjunto de obras magní- ficas para as cordas. Por outra, compreendemos certas limitações contemporâ- neas. Não há dúvida, de que os progressos e as exigên- cias da medicina moderna acarretam nosso maior distan- ciamento temporal e mental das atividades musicais. Essa ocorrência é lamentável. Citemos a estranha e conhecida frase de Stravinsky em sua autobiografia “a música por sua própria natureza é importante para expressar qualquer coisa, deve ser en- tendida apenas como um afronta a oponentes estéticos, que atribuíram as peças musicais, a fins extramusicais.” Sabemos ainda que, na Idade Média, um programa de cul- tura geral abrangia o estudo de sete artes liberais, herdadas da Antiguidade. Elas eram agrupadas em dois conjuntos: o Trivium , abrangendo três artes literárias (gramática, retórica e didática) e o Quadrivium , ulterior, com quatro disciplinas ma- temáticas (aritmética, geometria, astronomia e teoria musical). Como acentuou um competente educador e profundo co- nhecedor do assunto, o Prof. Murou, “a ciência musical abrangia essencialmente as leis numéricas, que regem a harmonia, mas o estudo da estrutura dos intervalos e da rítmica introduzia os indivíduos no mundo da melodia”. A magia permanece, expressiva, alentadora e sem declínio. Perante o universo da música, minha experiência na prática clínica da medicina autoriza-me a afirmar que ela modifica o ambiente que nos envolve e favorece a sensação de uma ple- nitude de vida. Essa sistemática sublime vem constituir ao médico um am- biente suave de seu mister diário dos consultórios, dando-lhe maior tranquilidade para formulação do diagnóstico e, eviden- temente, amenizando o estado de inquietude, ansiedades e receios dos seus pacientes. De qualquer forma, perante o universo da música, a minha vasta experiência na prática clínica cardiológica autoriza- -me a afirmar que a música modifica o ambiente que nos envolve, enriquece o momento e favorece a sensação de plenitude da vida. 39

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