Jornal SBC 154 | Maio 2015 - page 32

Jornal SBC 154 · Maio · 2015
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Opinião
A situação política e econômica
do Brasil não apenas tem
solução, como é, ela própria, a
solução para a crise moral que
vivemos. A crise é o jeito. Não
é à toa que o ideograma chinês
para crise e oportunidade é o
mesmo. Sabedoria milenar...
Corrupção, impunidade e
impotência ante os desmandos dos poderosos
têm levado cada vez mais brasileiros a deixar
o país. Os que ficam lamentam-se que iriam
também se tivessem a chance. “O Brasil não tem
mais jeito”, dizem uns a boca pequena, outros
aos gritos.
A crise econômica é séria, mas não é
a responsável por tanta desesperança.
A desolação é consequência de nossa crise
moral. O Brasil já enfrentou e superou muitas
crises econômicas e, mais cedo ou mais tarde,
superará esta também. Já a sensação de que o
Estado, nos mais diversos níveis, foi usurpado
por quadrilhas que o usam como um meio
para servir a interesses próprios é muito mais
grave e perniciosa. A própria razão de ser do
Estado democrático – servir à sociedade – foi
deturpada. Pior, esses grupos nos roubaram
o orgulho de ser brasileiro e a fé em nosso
próprio país. Na visão de muitos, o Brasil
voltou, em poucos anos, do país em que o
futuro parecia estar chegando ao país sem
solução, eternamente condenado ao fracasso.
É fácil entender a desilusão. A presidente reeleita
comandava o Conselho de Administração
da Petrobras no maior caso de corrupção
da história do planeta segundo o jornal
The
New York Times
. O presidente da Câmara dos
Deputados, o presidente do Senado, dezenas de
outros congressistas e até ex-ministros de Estado
e governadores estão sob investigação judicial
com fortes suspeitas de corrupção. O Judiciário,
supostamente o último bastião da legalidade
no país, está com sua credibilidade em xeque
após o passeio de Porsche do juiz que cuidava
do caso Eike Batista, a injustificada voz de prisão
dada por outro juiz à oficial de trânsito que
cumpria sua função e parou-o em uma blitz, e
as dúvidas quanto à imparcialidade do Supremo
Tribunal Federal para julgar políticos envolvidos
na Operação Lava-Jato.
Para piorar, enquanto o governo pede sacrifícios
à população e aumenta impostos, o Congresso
expande os benefícios dos congressistas e
aumenta os salários da presidente, de ministros,
juízes e os seus próprios. Não satisfeito, triplica
os recursos para os partidos políticos. E ainda
querem construir para uso próprio um palacete
ao custo de mais de R$ 1 bilhão. Pois é, o país
é rico.
Negar os problemas e desafios que o Brasil vive
seria, no mínimo, ingênuo. Igualmente ingênuo é
considerar permanente uma situação com tantas
fontes de instabilidade. A Operação Lava-Jato
abriu a caixa de Pandora. A delação premiada
ligou o ventilador.
A sociedade reagiu, como evidencia a maior
manifestação já vista no país em quase
trinta anos – as duas últimas, de proporções
semelhantes, resultaram na redemocratização
e no impeachment de Collor. Desta vez, não
ocorrerão transformações significativas na
política brasileira? Improvável.
Tem jeito sim
Ricardo Amorim*
Ricardo Amorim
Foto: Tiago Lima Photo
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