Palavra do Presidente

  • Como dar más notícias médicas?

    A esposa, os pequenos gêmeos e o pai idoso estavam à espera de notícias na entrada da enfermaria do clube. Um homem de 32 anos não sobrevivera a uma parada cardiorrespiratória ocorrida durante uma partida de futebol. O jovem médico, que se encontrava no local e havia prestado atendimento voluntário à emergência, é o escalado para conversar com os familiares.

    “Para quê preocuparmo-nos com a morte se a vida tem tantos problemas que temos de resolver primeiro?”, dizia Confúcio. Para nós médicos, há uma razão especial para nos preocuparmos com o tema. Afinal, dar más notícias é das mais difíceis tarefas de nossa profissão.

    São muitas as situações relativas ao contexto. Não só o relato do falecimento de um ente aos familiares, mas principalmente a comunicação ao próprio paciente de um diagnóstico terminal, de uma doença crônica grave, falar a uma gestante que seu filho tem uma malformação ou mesmo informar a um pai quanto à necessidade de uma cirurgia às vésperas do casamento da filha, entre outras ocorrências inusitadas.

    Entre as apreensões da equipe de saúde, uma revisão sobre o assunto destaca o temor de como a informação irá afetar o paciente e a família, incluindo familiares frá- geis; dúvidas sobre o prognóstico e a eficácia do tratamento; a possibilidade de problemas judiciais; a dificuldade em reconhecer incertezas e expressar emoções.

    O protocolo SPIKES* recomenda seis passos para a comunicação de más notícias médicas. O primeiro passo (Setting up) se refere à preparação do médico quanto ao conhecimento da doença, o real estado do doente e a escolha do local e hora adequados à comunicação. O segundo (Perception) sugere certificar-se até que ponto o paciente e a família têm consciência da situação. O terceiro (Invitation) procura entender quanto o paciente e/ou familiar desejam saber sobre a doença. O quarto (Knowledge) trata da transmissão da informação em si. Ensina a preparar uma introdução cabível ao tema, evitar o excesso de termos técnicos e testar a compreensão do ouvinte. O quinto passo (Emotions) recomenda responder empaticamente à reação demonstrada pelo paciente ou familiar, dando o tempo necessário à sua reflexão. O sexto (Strategy and Summary) objetiva reduzir a apreensão quanto ao comunicado ao revelar o plano terapêutico e o que pode vir a acontecer, quando pertinente.

    A comunicação de más notícias sobre a saúde representa a busca da harmonia entre razão e emoção. Mais que seguir um roteiro, faz-se necessário ter serenidade, empatia, compaixão, segurança e a compreensão da imprecisão dos prognósticos, assim como da finitude da vida apesar de todos os avanços da ciência.

    Foi Gustave Flaubert quem concluiu: “a morte talvez tenha mais segredos para nos revelar que a própria vida”.

    *Referência: Baile WK, Buckman R et al. Oncologist. 2000;5(4): 302-11.