Artigo Original
Bittencourt et al.
Células endoteliais, micropartículas e corredores
Arq Bras Cardiol. 2017; 108(3):212-216
Introdução
Um número adequado de
células progenitoras endoteliais
(CPEs) circulantes parece estar relacionado com a manutenção
da homeostase vascular.
1,2
De fato, número reduzido de CPEs foi
associado com fatores de risco e mortalidade cardiovasculares,
e recorr ncia de eventos cardiovasculares em indivíduos com
doença coronariana,
3,4
apesar de algumas controvérsias em
relação à forma de medida, caracterização, origem e destino
das células.
5,6
Micropartículas (MPs) são pequenas partículas (100-1000nm)
anucleadas de fosfolipídio, que podem ser identificadas por sua
origem – MPs endoteliais (MPEs), plaquetárias (MPPs), ou de
várias outras células. Número aumentado deMPEs foi associado
com dano e disfunção endotelial.
7,8
As MPPs, inicialmente
consideradas como marcadores de trombose, são atualmente
consideradas importantes para a sinalização transcricional, pela
interação com monócitos, e ativação de resposta inflamatória.
9
A prática de exercícios regulares tem sido amplamente
recomendada para a prevenção de doença cardiovascular.
Porém, informações sobre os efeitos da exposição cr nica
e intensa sobre esses biomarcardores vasculares são ainda
escassos.
10,11
Assim, o objetivo deste estudo foi avaliar os efeitos do
exercício cr nico sobre CPEs e MPs em corredores profissionais.
Métodos
População do estudo
Vinte e cinco corredores profissionais de meia maratona e
24 controles pareados por sexo e idade, sem diagnóstico de
doenças cardiovasculares foram incluídos prospectivamente.
Foramexcluídos indivíduos com fatores de risco cardiovasculares
tais como hipertensão, diabetes, obesidade, tabagismo, ou
hipercolesterolemia. As principais características da população
estudada estão apresentadas na Tabela 1. O comit de ética local
aprovou o estudo (#1808/08) e todos os participantes assinaram
o termo de consentimento antes de serem incluídos no protocolo
do estudo.
Análises laboratoriais
As amostras de sangue foram obtidas após 12 horas de
jejum, e as análises foram realizadas no laboratório central de
nossa universidade. Todos os atletas mantiveram seus programas
de exercício diário até mesmo no dia anterior ao da coleta de
amostra de sangue. Os programas de treinamento dos atletas
erammuito semelhantes entre si, correspondendo a duas sessões
de corrida de longa distância diariamente, 15 km de manhã e
10 km à tarde, e treinamentos intensivos (tiros de 100 a 1000 m
de distância, repetidos várias vezes) duas vezes por semana, nas
terças e quintas de manhã. Todas as amostras de sangue foram
colhidas nas quintas-feiras, antes do exercício.
Asmedidas deCPEs eMPs foram realizadas conforme descrito
anteriormente, utilizando amostras de sangue fresco colhido em
tubos contendo EDTA.
12-15
Para a determinação de CPEs, foram
adquiridos ummínimo de 500 000 eventos for citometria de fluxo
(FACSCalibur, BD Biosciences, USA). Foram usados anticorpos
de camundongos anti-humanos marcados por fluoresc ncia
para CPEs (CD34 FITC, BD Biosciences, USA; CD133 APC,
Miltenyi Biotec, USA; KDR PE, R&DSystems, USA), MPPs (CD42
FITC e CD31 PE, BD Biosciences, USA), e MPEs (CD51 FITC,
BD Biosciences). Foram usados recipientes descartáveis para
quantificar o número demicropartículas por microlitro de plasma
pobre em plaquetas (PPP).
Análise estatística
Os resultados são apresentados em média ± desvio
padrão (DP) ou mediana e intervalo interquartil para
distribuições normais e não normais respectivamente.
As variáveis categóricas foram comparadas por teste de qui-
quadrado de Pearson. Os testes de Kolmogorov-Smirnov e
Shapiro-Wilk foram usados para avaliar a normalidade das
variáveis contínuas. Comparações entre grupos das variáveis
contínuas foram feitas pelo teste t não pareado ou pelo teste de
Mann-Whitney quando apropriado. O teste de correlação de
Spearman foi usado para avaliar correlações de CPEs e MPs com
variáveis de ergoespirometria. Todas as análises foram realizadas
pelo programa SPSS para Windows, versão 17.0 (SPSS, Inc.,
Chicago, IL), e um valor de p<0.05 foi considerado significativo.
Resultados
As características principais da população estudada
estão descritas na Tabela 1. Todos os atletas relataram
haver feito exercício no dia anterior à coleta de sangue
(22,08±2,67 km, média ± DP), e a média de tempo entre
a última sessão de exercício e a coleta de sangue foi de
16,5 ± 2,8 horas. Não houve diferença entre homens e
mulheres quanto à distância percorrida (124 ± 25
vs
. 128
± 29 km por semana, p=0,88, respectivamente, média
± DP, teste t não pareado) ou tempo de treinamento
(14±4
vs
. 14±7 horas por semana, média ± DP, p=0,53,
respectivamente, teste t não pareado). Apesar de
haverem recebido o mesmo treinamento, atletas do sexo
masculino relataram um melhor tempo médio para a
distância de 10 000 metros em comparação a atletas do
sexo feminino (32,4 ± 2,1 vs. 37,6±1,6 min, p<0,0001,
média ± DP, teste t não pareado). Em comparação aos
controles, os atletas apresentaram menor peso, índice de
massa corporal, circunfer ncia abdominal, e porcentagem
de gordura corporal, menor frequ ncia cardíaca, maior
porcentagem de gordura corporal e valores similares de
pressão sistólica e diastólica. Apresentaram ainda menores
níveis de colesterol total, LDL-c e triglicerídeos, e valores
mais elevados de HDL-c.
Células progenitoras endoteliais e micropartículas
Em comparação aos controles, os atletas apresentaram
maior porcentagem de duas linhagens de CPEs (CD34+/
KDR+ e CD133+/KDR+) e porcentagem similar de células
CD34+/CD133+ (Figura 1).
A quantidade de MPP não foi diferente entre os grupos
(Figura 2).
Não houve correlação entre a porcentagem de CPEs ou
MPs com variáveis de ergospirometria, incluindo taxa absoluta
e máxima de consumo de oxig nio (VO
2
max) (dados não
apresentados).
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