Mídia
divulga informações erradas sobre ataques cardíacos
Preste atenção neste texto. É parte editada de
um artigo publicado no Journal of General Hospital Rochester nº
240:
"Digamos que às 16h30m você está indo
para casa, sozinho, de carro, depois de um dia bastante pesado no
serviço, não só porque trabalhou bastante, mas porque também
teve uma discussão com seu chefe e não houve jeito de fazê-lo
entender seu ponto de vista.
Você está realmente aborrecido e quanto mais
pensa sobre o assunto, mais tenso você fica.
De repente, você sente uma dor muito forte no
peito que se irradia pelo braço e sobe até o queixo. Você está a
uns oito quilômetros do hospital mais próximo e não tem certeza
se vai conseguir chegar até lá. O que fazer? Você fez um curso de
primeiros socorros, mas não é que o instrutor se esqueceu de
explicar o que fazer quando a vítima é você mesmo?
Sem assistência, a pessoa cujo coração
pára de funcionar adequadamente e que começa a sentir que vai
desmaiar, tem apenas 10 segundos antes de perder a consciência.
O que fazer para sobreviver quando estiver
sozinho?
Resposta: Essas vítimas podem ajudar a si
mesmas tossindo com força repetidas vezes. Inspire antes de tossir,
tussa profunda e prolongadamente, como quando está expelindo
catarro de dentro do peito.
Repita a seqüência a cada dois segundos,
até que chegue auxílio ou até que o coração volte a funcionar
normalmente.
A inspiração profunda leva oxigênio aos
pulmões e a tosse contrai o coração e faz com que o sangue
circule. A pressão da contração no coração também o ajuda a
retomar o ritmo normal. Desse modo, uma vítima de um ataque
cardíaco pode fazer uma ligação telefônica e, entre as
inspirações, pedir ajuda."
Os relatos sobre manutenção de fluxo sangüíneo com tosse são
verdadeiros, mas se referem, em geral, a pacientes na sala de
hemodinâmica (portanto, deitados e com maior facilidade para
chegada do sangue até o cérebro) e, mesmo assim, por pouco tempo.
Seria irreal acreditar que uma pessoa sentada, ou de pé,
conseguisse manter um fluxo cerebral até a chegada de ajuda ou,
ainda menos provável, "até que o coração voltasse a
funcionar" como é sugerido no material.
O texto fala ainda que a ação pode salvar
muitas vidas e cita como referência uma revista não encontrada no
medline (n.º 240 do Journal of General Hospital Rochester).
O Ilcor (International Liasion Committee on
Resuscitation), órgão regulador mundial sobre assuntos de
Emergências Cardiovasculares e Ressuscitação, tem como um dos
líderes em assuntos de Emergências e Ressuscitação Roger Dean
White. O especialista desconhece o trabalho. Ou seja, a
informação, que já é veiculada em diversos sites, não tem aval
confiável. Apenas campanhas preventivas, primárias e secundárias,
como a contra o tabagismo, são eficazes na diminuição dos ataques
cardiovasculares.
A morte súbita cardíaca é a principal causa de
morte no mundo em pessoas acima de 40 anos. Em 1998, o SUS
apresentou um número de 160 mil mortes/ano. Artigos, como o
apresentado, mostram a necessidade de uma legislação que contemple
cursos de SBV e a implementação de desfibriladores em locais de
alta concentração, bem como uma política racional como a feita
para portadores de HIV, com medicamentos e equipamentos que estejam
disponíveis para a população no combate à morte súbita, sem os
quais o índice de sobrevivência em caso de ataque dificilmente
deve superar os atuais dois por cento.
Sérgio Timerman
timermam@cardiol.br |