A partir desta edição, o leitor do Jornal da SBC
conta com um novo espaço para esclarecer suas dúvidas jurídicas ligadas
ao exercício da cardiologia e à Sociedade. O novo Canal Jurídico conta
com a participação do advogado Paulo Roberto Andrade, que vai tirar as
dúvidas dos leitores encaminhadas ao e-mail pra.toan@terra.com.br Na
inauguração do espaço, quem pergunta é o Presidente da Comissão
Eleitoral, Carlos Alberto Toscano da Graça.
Graça: O parágrafo 4º do
artigo 31 do estatuto da SBC, que veda a reeleição presidencial, deve se
aplicar aos associados que ocuparam a presidência da entidade antes da
reforma que introduziu esse dispositivo no estatuto, em 31 de julho de
2000?
Essa questão envolve um conceito jurídico bastante
intricado, que é o de "direito adquirido". Contudo, uma
análise detida das disposições legais, assim como dos posicionamentos
doutrinários e jurisprudenciais mais recentes acerca do tema, leva-nos à
conclusão de que a norma estatutária que proíbe a reeleição deve se
aplicar indistintamente a todos aqueles que já ocuparam, a qualquer
tempo, o cargo de presidente.
Em linhas muito gerais, um texto de lei (ou de um
estatuto, como é o caso), exclusivamente considerado, não é suficiente
para constituir o direito adquirido; é preciso a superveniência de um
ato concreto, exercido pelo titular do direito, que tenha o efeito de
"aquisição" do direito. No nosso caso, portanto, não basta
que o estatuto assegure ou permita uma reeleição para que os
ex-presidentes tenham esse direito. É necessário que os mesmos pratiquem
um ato (no caso, o da candidatura) que concretize o direito.
"Texto de lei
não basta para constituir o direito adquirido" |
Em outras palavras, para que seja juridicamente adquirido, o direito
deve ser desde logo "exercível" pelo seu titular. No caso em
referência, pela mudança do estatuto em julho de 2000, o direito à
reeleição para todos os anos subseqüentes, evidentemente, ainda não
era exercível pelos associados, o que só viria a ocorrer pela abertura
do processo eleitoral de cada ano, nos prazos estatutários.
Assim, no momento da alteração do estatuto, os
ex-presidentes da SBC ostentavam somente o que se costuma chamar de
"expectativa de direito", ou uma "faculdade
potencial", e não um direito adquirido. E, se assim é, a norma
estatutária que veda a reeleição alcança-os plenamente.
Entendo, portanto, que, do ponto de vista
técnico-jurídico, a lista de presidenciáveis não deve incluir
quaisquer ex-presidentes da entidade.
Graça: A primeira fase do
processo eleitoral da SBC pode ser implementada via internet, tal como
ocorre na segunda fase?
Essa controvérsia envolve os artigos 31, caput, e 35,
inciso II, do estatuto: aquele impõe que a segunda fase seja realizada
via internet, enquanto este, que trata da primeira fase, silencia quanto
ao método de realização. Ao assim dispor, o estatuto não proíbe que
se utilize a internet também na primeira fase. Tal entendimento não se
mostraria compatível com uma interpretação razoável e sistemática do
estatuto: faria algum sentido o estatuto obrigar um método para uma fase
e proibir esse mesmo método para outra? Em outras palavras, faria sentido
o estatuto dispor que "para uma fase, só se aceita o método X; para
a outra, aceita-se qualquer outro método, com exceção do método
X?". Parece evidente que não.
Paulo Roberto Andrade
pra.toan@terra.com.br |