ABC | Volume 108, Nº3, Março 2017 - page 82

Artigo de Revisão
Avaliação Genética, Estudo Familiar e Exercício
Genetic Evaluation, Familial Screening and Exercise
Ricardo Stein,
1,2,3,4
Juan Pablo Trujillo,
5,6
Anderson Donelli da Silveira,
1,4
Arsonval Lamounier Júnior,
5,6
Lorenzo
Monserrat Iglesias
5,6
Programa de Pós-Graduação em Cardiologia e Ciências Cardiovasculares da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande
do Sul
1
; Grupo de Pesquisa em Cardiologia do Exercício do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (CardioEx);
2
Serviço de Fisiatria e Reabilitação
do Hospital de Clínicas de Porto Alegre - Universidade Federal do Rio Grande do Sul;
3
Vitta Centro de Bem Estar Físico,
4
Porto Alegre, RS - Brasil;
Health in Code,
5
La Coruña - Spain; Grupo de Investigación Cardiovascular de La Universidad de La Coruña,
6
La Coruña - Spain
* Ricardo Stein e Juan Pablo Trujillo contribuíram de forma idêntica e são primeiros autores do manuscrito.
Introdução
A prática de atividade física regular é benéfica
para pessoas de todas as idades, g neros e etnias.
1
Se, por um lado, a prática do exercício moderado é
considerada uma atividade saudável e favorável ao sistema
cardiovascular, por outro, o exercício de alta intensidade
por longo período de tempo pode aumentar o risco
de morte súbita (MS).
2
Mesmo considerando que um
número imenso de pessoas faça exercício diariamente,
a MS nesse cenário é considerada uma entidade rara.
No entanto, a sua prevenção pode ser difícil e a mesma é
de grande repercussão, principalmente quando incide em
jovens praticantes de exercício recreativo ou em atletas. Do
ponto de vista epidemiológico, a MS de origem cardíaca afeta
entre 200 e 400 mil indivíduos nos Estados Unidos (EUA)
anualmente.
3
No âmbito dos esportes, estima-se que em
torno de 200 atletas ao ano apresentem um evento fatal.
4
Na Espanha, o registro nacional de MS em atletas descreveu
180 casos de 1995 até 2007, sugerindo uma incid ncia de
15 a 20 casos por ano.
5
Em atletas, a avaliação pré-participação (APP) está indicada,
podendo ser eficaz para a prevenção de MS cardíaca nesse
contexto.
6
Contudo, esse tipo de rastreamento apresenta
grande variabilidade entre diferentes países e entidades que
o realizam. No tocante à avaliação genética, essa se encontra
relegada somente a casos específicos no contexto dos esportes.
Nessa revisão descreveremos aspectos básicos da avaliação
genética, assim como as indicações da análise molecular e sua
correta interpretação clínica, tanto para esportistas recreativos ou
amadores, quanto para os atletas de alto rendimento.
Morte súbita no atleta: Que doenças podem estar envolvidas?
Uma das principais preocupações nas diferentes atividades
esportivas é poder estabelecer o risco de MS para cada
indivíduo e se essa atividade poderia incrementar o risco.
É possível que exista uma relação entre o tipo de esporte
praticado e a causa da MS, aspecto que deve ser levado em
conta no momento do rastreamento e da prevenção. Dados
recentes estimam que entre atletas jovens norte-americanos
(<35 anos), a incid ncia deMS estaria entre 1 e 3 por 100.000.
7
Já em atletas com mais de 35 anos, esse valor pode ser maior,
tendo em vista que o risco de MS por cardiopatia isqu mica
aumenta progressivamente com a idade.
Ainda são poucos os estudos observacionais disponíveis,
a maioria realizada em países como EUA, Itália, Espanha e
Dinamarca.
5,8,9
Essas investigações coincidem na identificação
das diferentes causas deMS em atletas commenos e mais de 35
anos de idade. As mais frequentes nas faixas etárias mais jovens
são as miocardiopatias, canalopatias e anomalias das artérias
coronárias. Já no grupo de maior idade, a principal causa é a
doença arterial coronária (DAC), a qual contribui para mais da
metade dos casos de MS nesse cenário.
10
Na Espanha, segundo
o
Registro Nacional de MS emDeportistas,
5
as principais causas
seriam: não identificada (27%), miocardiopatia arritmog nica
do ventrículo direito (MAVD, 14%), miocardiopatia hipertrófica
(MCH, 12%), hipertrofia do ventrículo esquerdo idiopática (8%),
anomalias coronárias (10%), estenose aórtica (6%) e miocardite
(4%). Infelizmente, não dispomos de dados da epidemiologia
da MS em atletas no Brasil.
Dessa forma, para atletas jovens, o
screening
deve focar em
identificar doenças cardíacas herdadas como as canalopatias
e as miocardiopatias. Por outro lado, nos indivíduos de maior
idade, assim como na população em geral, a avaliação deve
enfocar o diagnóstico de DAC.
11
Avaliação Genética Clínica no Esportista
De acordo com diferentes consensos e opiniões de
especialistas, a avaliação genética não é indicada como um
processo de rotina para os atletas. Se ainda estamos discutindo
se o eletrocardiograma é indicado ou não como um teste de
rotina na APP, é logico entender que a realização de um estudo
genético deva ser sempre muito bem embasada no atleta.
Existem duas ocasiões nas quais a avaliação genética está
especialmente indicada. São elas:
a) frente a uma história familiar positiva de doença cardíaca
hereditária (miocardiopatias, canalopatias, doenças da aorta) ou
suspeita da mesma (presença de episódios de síncope, arritmias,
parada cardíaca/MS). Nesses casos, é importante destacar que
o estudo genético deve ser feito primeiramente no indivíduo ou
Palavras-chave
Genética; Genótipo; Exercício; Hereditariedade; Medicina
Esportiva; Morte Súbita Cardíaca.
Correspondência: Ricardo Stein •
HCPA - UFRGS. João Caetano, 20/402, Petrópolis. CEP 90470-260, Porto
Alegre, RS - Brasil.
E-mail: rstein@cardiol.br
Artigo recebido em 06/11/2016; revisado em 17/11/2016; aceito em
17/11/2016.
DOI:
10.5935/abc.20170015
263
1...,72,73,74,75,76,77,78,79,80,81 83,84,85,86,87,88,89,90,91,92,...108
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